sexta-feira, 7 de setembro de 2012

EUTERPE OLERACEA

Açaí, guardiã, zum de besouro um imã, branca é a tez da manhã. Olha, eu já tentei entender de todo jeito o que o talentoso Djavan queria dizer quando escreveu essa pérola e confesso que eu ainda não consegui.

Acho que essa letra surgiu num daqueles momentos em que o tico e o teco estão praticando bungee jumping. Mas o que importa é que se tornou um sucesso eternizado na voz suave desse cantor, compositor, produtor, arranjador, músico e poeta.

Neste post vou "pinçar" a palavra "açaí" para falar da boa juçara maranhense, uma bebida (ou comida, dependendo da quantidade de farinha) de sabor forte, marcante que não pode ser comparado a qualquer outra fruta. Tudo bem que ela pode ser encontrada também na Venezuela, Colômbia, Equador e Guianas, mas é somente aqui, e principalmente no Maranhão que colocamos nossa cultura, história e emoções no consumo desta iguaria.

Desde o tempo em que a professora Rosa Mochel morou no Maracanã e na mesma época em que ela sonhou com o projeto Casa de Alice, foi também  o tempo de embrionar em seu sítio a festa de sabor e tradição culturais.

Todos os domingos, de outubro a novembro no tempo da minha existência, muitos caroços de juçara foram deixados de molhos em baldes e bacias, esmagados por muitas garrafas de todas as cores e tamanhos em milhares de peneiras apoiadas em muitas, muitas coxas de todas as etnias mas certamente, em sua maioria negras.

Saboreou-se milhares de metros cúbicos de juçara nesses 42 anos de tradição e conversou-se, na terra preta do arraial da festa, muito miolo de pote e muita coisa séria e importante. Intelectuais, artistas e poetas se misturavam (e não se destacavam) ao povo simples do maracanã e ostentava-se no máximo sua cuia e colher trazida de casa. Era um tempo de alegria, simplicidade e fartura. Ninguém "batizava" a juçara pra ganhar mais. O objetivo era vender a melhor juçara, não vender mais juçara adicionando mais água que o necessário. Havia um código implícito de boa fé nas barracas de juçara.

Hoje a "Festa da Juçara" agoniza em seu leito, ferida de morte por radiolas de reggae, barracas onde sobra álcool e falta juçara e pessoas com os objetivos dos mais diversos, exceto o de tomar juçara.

Ainda é possível encontrar em São Luís, alguns lugares na periferia onde podemos comprar uma boa juçara. Não vem mais produzida pelo ritmo da batida do fundo da garrafa nem no balanço ritmado das mãos simples e lavadas esfregando e separando o caroço da polpa no fundo da urupema. É feita em frias máquinas motorizadas que trituram a casca, a polpa e poesia das minhas lembranças de infância, deixando cair na bandeja de resíduo, o caroço, a água e a saudade.
Registrei estas duas fotos durante num desses dias em que tomei juçara. A primeira é ela quase acabando na jarra de vidro. E a segunda é o belo desenho que fica quando se cumpre uma tradição terapêutica - tomar água na vasilha suja pra se esquivar da azia.

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